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Governança corporativa e empresas familiares

por Mariana Barsaglia Pimentel

Em texto anterior[1], escrevi sobre a governança das sociedades anônimas sob a perspectiva do acionista minoritário. Entretanto, a governança corporativa é um tema amplo, do qual decorrem diversos desdobramentos. Dado esse leque de possibilidades, este texto analisa a governança corporativa sob outro enfoque: o das empresas familiares.

Como visto no texto acima referido, a governança corporativa é definida como “um sistema formado por princípios, regras, estruturas e processos pelo qual as organizações são dirigidas e monitoradas, com vistas à geração de valor sustentável para a organização, para seus sócios e para a sociedade em geral”[2]. De acordo com o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa, a governança “evoluiu significativamente nos últimos anos, expandindo seu foco da otimização de valor econômico exclusivamente aos sócios para o objetivo de geração de valor compartilhado entre os sócios e as demais partes interessadas”[3].

Em linhas gerais, é possível dizer que a governança corporativa está diretamente relacionada com a forma de organização interna das sociedades, especialmente em relação aos seus órgãos de gestão e deliberação – o que repercute no ambiente interno e no ambiente externo às organizações. Esta profissionalização das estruturas e dos processos das sociedades tem uma relevância especial no contexto das empresas familiares.

Segundo Gallo e Kenyon-Rouvinez, “a governança de empresas familiares é um sistema de processos e estruturas colocados em prática no mais alto nível da empresa, da família e da propriedade, que possibilita a tomada das melhores decisões possíveis em relação à direção do negócio[...]”[4]. De acordo com os autores, embora a governança corporativa seja um tema bastante debatido na atualidade, ele nem sempre é compreendido no âmbito das empresas familiares[5].

Este problema detectado por Gallo e Kenyon-Rouvinez tem algumas explicações. As empresas familiares têm peculiaridades e complexidades próprias, podendo-se citar como exemplos: a pessoalidade e o alto grau de subjetividade na condução dos negócios e na tomada de decisões; o ímpeto de proteção aos integrantes da família (que trabalham e/ou são sócios/acionistas das empresas familiares); a sobreposição de papéis (profissionais e familiares) e os próprios conflitos familiares. Com efeito, “empresas familiares são entidades complexas onde os papéis da família, gestão e propriedade podem ser facilmente confundidos”[6].

Para além dos pontos acima mencionados, uma outra grande questão na conjuntura das empresas familiares guarda relação com a transição geracional – o que ocorre quando surge a necessidade de assunção da condução dos negócios pelos integrantes das novas gerações. Não são raros os casos em que os integrantes da família se deparam com problemas decorrentes do choque geracional e da própria sucessão legal em si.

Dentre as possíveis instituições da governança corporativa familiar a serem adotadas pelas empresas familiares, tem-se: (a) no âmbito da família: o conselho de família e a assembleia familiar; (b) no âmbito da propriedade (aqui compreendida como a participação societária): o conselho e a assembleia de sócios/acionistas; (c) no âmbito da empresa (em termos de gestão): o conselho de sócios/acionistas, o conselho de administração, o conselho fiscal e a diretoria executiva. Dentro do sistema de governança, há, ainda, instrumentos negociais que podem regulamentar as relações jurídicas nas esferas da família e da empresa, tais como o acordo de sócios ou acionistas, o protocolo familiar, o testamento e os pactos antenupciais.

A adoção destas estruturas, regras e processos de governança é capaz de fornecer “boas soluções para os desafios da propriedade familiar e geralmente são indispensáveis para o sucesso de longo prazo do negócio — e, para a paz na família controladora, principalmente nas gerações seguintes”[7]. A governança corporativa, neste cenário, assume um importante papel no contexto das empresas familiares, possibilitando que sejam devidamente separados os papéis a serem desenvolvidos pelos agentes nos âmbitos da família, da empresa (em termos de gestão) e da propriedade (em termos de participação societária).

Em linhas conclusivas, é possível afirmar que a implementação de uma robusta governança corporativa pode trazer inúmeros benefícios às empresas familiares e aos seus integrantes, profissionalizando a atividade comercial, sem que se perca de vista os interesses da família empresária.

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[1] PIMENTEL, Mariana Barsaglia. Um sobrevoo sobre a governança das sociedades anônimas sob a perspectiva do acionista minoritário. Disponível em: https://www.medina.adv.br/conteudos/publicacoes/um-sobrevoo-sobre-a-governanca-das-sociedades-anonimas-sob-a-perspectiva-do-acionista-minoritario. Acesso em: 23 fev. 2025.

[2] IBGC (Instituto Brasileiro de Governança Corporativa). Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa. 6.ª ed. 2023. p.17.

[3] IBGC (Instituto Brasileiro de Governança Corporativa). Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa. 6.ª ed. 2023. p.16.

[4]  Tradução livre de: “Family business governance is a system of processes and structures put in place at the highest level of the business, family, and ownership to make the best possible decisions regarding the direction of the business [...]”. (GALLO, Miguel Angel; Kenyon-Rouvinez, Denise. (2005). The Importance of Family and Business Governance. In: Family Business. A Family Business Publication. Palgrave Macmillan, London. 2005. p. 45. Disponível em: https://link.springer.com/chapter/10.1057/9780230287730_4. Acesso em: 23 fev. 2025).

[5]  GALLO, Miguel Angel; Kenyon-Rouvinez, Denise. (2005). The Importance of Family and Business Governance. In: Family Business. A Family Business Publication. Palgrave Macmillan, London. 2005. p. 45. Disponível em: https://link.springer.com/chapter/10.1057/9780230287730_4. Acesso em: 23 fev. 2025.

[6] Tradução livre de: “Family businesses are complex entities where the roles of the family, management, and ownership can be easily confused”. (GALLO, Miguel Angel; Kenyon-Rouvinez, Denise. (2005). The Importance of Family and Business Governance. In: Family Business. A Family Business Publication. Palgrave Macmillan, London. 2005. p. 45. Disponível em: https://link.springer.com/chapter/10.1057/9780230287730_4. Acesso em: 23 fev. 2025).

[7] IFC (International Finance Corporation). Guia Prático de Governança Corporativa: Experiências do Círculo de Companhias da América Latina. 2010. Disponível em: https://www.ifc.org/content/dam/ifc/doc/mgrt/portuguese-cg-guide-full.pdf. Acesso em: 23 fev. 2025. p. 127.


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