Artigo: STJ entende ser possível a penhora da garantia fiduciária em execução de título extrajudicial

Por Vinícius Secafen Mingati e Marcos Thadeu Piffer Filho

 A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu recentemente, no julgamento do REsp 1.766.182/SC, pela possibilidade de realização de penhora do bem objeto da alienação fiduciária, na situação em que o credor opta pelo manejo da ação executiva, em detrimento da ação de busca e apreensão.

A alienação fiduciária teve, desde sua origem, um importante papel no fomento à produção e ao consumo de bens móveis e imóveis, de forma a aproximar as instituições financeiras do consumidor final do crédito. Tal facilidade se justifica já que a financeira mantém a propriedade do bem em suas mãos, transferindo apenas a posse indireta ao tomador. Permite-se, assim, a fixação de vantagens não verificáveis em outras modalidades de contratos bancários, o que, por óbvio, atrai sobremaneira os interessados.

Na mesma linha do incremento na utilização dessa modalidade de garantia, verifica-se o crescimento da judicialização dos contratos de empréstimo garantidos por alienação fiduciária, em geral materializados por meio de uma cédula de crédito bancário. Ganham destaque, assim, uma série de discussões jurídicas, sendo a mais atual aquela atinente à possibilidade de o credor fiduciário optar, em caso de inadimplemento, pelo ajuizamento da execução de título extrajudicial, e não pela ação de busca apreensão, prevista no Decreto-lei n. 911/69.

A questão principal surge, em verdade, quando o exequente requer a penhora sobre o bem ofertado em garantia fiduciária. Poderia o credor requerer referida constrição sobre o bem do qual detém a propriedade, ainda que resolúvel?

A decisão proferida pela 3ª Turma do STJ, de relatoria do Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, reafirmou entendimento já exposto em outros julgados da corte (REsp 1.629.861/DF, REsp 838.099/SP e REsp 448.489/RJ), no sentido de que “a penhora pode recair sobre o próprio bem dado em garantia no contrato de alienação fiduciária se o credor optar pelo processo executivo (pretensão de cumprimento das obrigações), hipótese dos autos, ao invés da ação de busca e apreensão (pretensão de resolução do contrato)”.

Toda a controvérsia se formou a partir de decisões judiciais que vinham indeferindo os requerimentos de penhora sob o argumento de que esta seria ineficaz se realizada sobre bem que já integra o patrimônio do credor.

Tal posição, no entanto, desconsidera o fato de que, nessas situações, a posse do bem está em mãos do devedor, que dificultará ao máximo a disponibilização da garantia, mesmo respondendo esta pelo inadimplemento da dívida.

O ministro relator do REsp 1.766.182/SC fez questão de trazer à tona, como razão de decidir, fundamento outrora utilizado pela Ministra Nancy Andrighi no julgamento do REsp 1.629.861/DF, afirmando que a “intenção do devedor fiduciante, ao afetar o imóvel ao contrato de alienação fiduciária, não é, ao fim, transferir para o credor fiduciário a propriedade plena do bem, como sucede na compra e venda, senão apenas garantir o adimplemento do contrato de financiamento a que se vincula, visando, desde logo, o retorno das partes ao status quo ante, com a restituição da propriedade plena do bem ao seu patrimônio.”

Não se mostra razoável impossibilitar ao credor fiduciário exercer o direito decorrente da garantia por meio da penhora do referido bem. Configuraria ofensa ao princípio da efetividade da execução, além de formalidade excessiva, impedir a constrição do bem dado em garantia fiduciária simplesmente por este pertencer ao próprio credor.

Tal construção interpretativa geraria uma situação peculiar, em que o credor busca medidas constritivas capazes de satisfazer a execução, mas não pode o fazer através da retomada de bem de sua propriedade, dado em alienação fiduciária.

Importante destacar que tal mecanismo de satisfação da dívida, além de atender à maior efetividade do processo executivo, mostra-se meio menos gravoso que diversas outras medidas constritivas, já que o próprio devedor anuiu com a constituição deste bem como garantia de eventual descumprimento contratual, tendo plena ciência de que este responderia em caso de inadimplemento.

Com a recente decisão, o STJ se posiciona de maneira mais incisiva no fortalecimento da garantia fiduciária, com reflexos potencialmente capazes de impactar futuros empréstimos, possibilitando-se o oferecimento de melhores condições contratuais aos interessados.