Contrato de term sheet no venture capital

É mais que reconhecida, atualmente, a importância da iniciativa empresarial ao desenvolvimento econômico de um país. Impossível deixar de considerar que uma cultura que incentive o empreendedorismo, com acesso ao capital e à capacitação da mão de obra, por exemplo, interfere no desenvolvimento econômico de um país.

Nas palavras de N. Gregory Mankiw (Introdução à Economia. São Paulo: Cengage Learning, 2021, p. 417), “uma nação só pode usufruir de um padrão de vida elevado se puder produzir uma grande quantidade de bens e serviços”.

Isso importa em dizer que cada vez mais a dinâmica de desenvolvimento econômico está vinculada ao constante fluxo de novas empresas que chegam ao mercado com inovações tecnológicas, de gestão e de concepção de negócios. Nesse panorama, aparecem as atividades de venture capital, que apresentam um perfil de risco/retorno muito atraente, capaz de proporcionar um impacto significativo na economia, seja pelo incentivo ao crescimento empresarial, aumento da renda e até mesmo pela criação de novos empregos.

Venture capital é uma modalidade de investimento realizada através de capital de risco, com o objetivo de financiar empresas em estágio inicial, de pequeno ou médio porte, com baixo faturamento, mas com grande potencial de crescimento (FRANÇOSO, M. S.; QUEIROZ, S. R. R. de. Venture capital e inovação: uma análise a partir das startups de combustíveis dos Estados Unidos. R. Tecnol. Soc., Curitiba, v. 12, n. 25, p. 91-110, mai./ago. 2016. Disponível em: <https://periodicos.utfpr.edu.br/rts/article/view/3750>. Acesso em: 26.08.2022). O investidor busca conseguir boas oportunidades de alocação de recursos, sendo que a elevada possibilidade de retorno e taxa de crescimento são condições necessárias para justificar os custos elevados envolvidos na estruturação, negociação e monitoramento do investimento, bem como a baixa liquidez e o risco associados ao investimento em empresas fechadas ou de baixa capitalização (CARVALHO, A. G.; RIBEIRO, L. L.; FURTADO, C. V. A Indústria de Private Equity e Venture Capital: primeiro censo brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 135).

Segundo a Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital (ABVCAP), o venture capital é um “instrumento fundamental no desenvolvimento do mercado de capitais e economias emergentes, e tem se destacado de forma expressiva no Brasil” (Disponível em <https://www.abvcap.com.br/Download/IndustriaPEVCSobreSetor/21.pdf>. Acesso em 16.08.2022).

O risco decorre, em maior ou menor grau, da incerteza que permeia esse tipo de negócio, por se tratar de empresas jovens que não possuem referências históricas, níveis antecipados de performance e, em certos casos, pouca ou nenhuma informação especifica sobre o interesse do mercado no qual planeja atuar, o que leva a falta de conhecimento sobre a expectativa de resultados futuros da atividade. A maior fragilidade da tomada de decisão de investimentos em projetos, principalmente nas empresas de capital de risco, está relacionada à subjetividade e alto grau de incerteza.

Como dito, no venture capital o investidor busca boas oportunidades para alocar os seus recursos e, para isso, é muito importante ele respeitar o timing que o próprio mercado estabelece, garantindo que o investimento seja realizado em momento oportuno e consiga propiciar sucesso no empreendimento.

Mas a velocidade não significa intrepidez ou imprudência, sendo muito importante trazer segurança jurídica nesta transação, calibrando o risco envolvido, caso a caso. Por isso, o desafio é garantir que a velocidade não coloque em risco a posição dos investidores, dos fundadores ou da companhia ao longo da jornada de maximização de resultados e valorização do capital investido, de modo a criar uma governança que seja protetiva, mas que, ao mesmo tempo, não atrapalhe o negócio, futuras captações e os possíveis eventos de liquidez.

Neste contexto de grandes incertezas em relação ao retorno de um investimento em venture capital e a necessidade de velocidade na tomada de decisões, cresce a relevância de um contrato bem redigido, que permita que todos os envolvidos tenham uma visão mais clara (mesmo que inicial) do investimento, suas condições e termos e, ao mesmo tempo, seja capaz de calibrar os riscos que envolvem esse tipo de negócio.

Em geral, durante um processo de investimento, o primeiro documento a ser preparado é o term sheet, que apresenta os principais termos e condições de um investimento proposto, de forma simplificada, contendo os direitos e obrigações de cada uma das partes envolvidas na operação, auxiliando no preparo dos documentos definitivos do investimento. “As disposições do Term Sheet, em geral, não têm a pretensão de criar um vínculo de obrigações jurídicas entre as partes, com exceção de determinadas cláusulas – como por exemplo aquelas relacionadas à confidencialidade, exclusividade, aconselhamento e despesas” (Guia para Term Sheets de Venture Capital e Private Equity BRASIL. Disponível em <https://www.lavca.org/app/uploads/2017/01/Guide-TermSheets-Brazil-PT.pdf>. Acesso em 16.08.2022).

Cada negociação empresarial envolve seus próprios termos e condições, conforme as peculiaridades do investimento e as preferências de cada investidor. Além disso, diante do alto grau de incerteza que apresenta o venture capital, dificilmente o contrato irá prever todas as contingências possíveis. Como bem acentua Paula A. Forgioni (FORGIONI, Paula A. Contratos Empresariais. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021, p. 61), “contratos são por natureza, incompletos e maior sua complexidade, mas as lacunas far-se-ão sentir”.

De todo modo, é sempre bom esclarecer as regras do jogo, alinhando as expectativas de cada uma das partes e definindo suas responsabilidades e direitos. Como bem destaca Ronald Coase, “a melhor forma de organização das atividades é a definição de um feixe de contratos que organize as trocas no mercado e reduza custos de transação” (COASE, Ronald H. “The nature of the firm”. In The firm, the Market, and the law. Chicago: University of Chicago Press, 1990, p. 36-39, 41-42).

Por meio do term sheet, assim, é possível definir um conjunto de atos coordenados para alcançar a finalidade almejada e calibrar os riscos que permeiam o negócio. A título de exemplo, cita-se a cláusulas de tag along, mecanismo previsto no art. 254-A da Lei das S.A. (Lei n. 6.404/1976, dispositivo incluído pela Lei 10.303/2001), que busca dar mais garantia aos acionistas minoritários caso o controle da empresa passe para um novo investidor, e a cláusula de antidiluição, que objetiva prevenir a diluição da participação do investidor, no caso de aumentos posteriores no capital com valores distintos ao praticado na rodada anterior.

É certa, então, a importância de novas iniciativas empresariais para o desenvolvimento do país, sendo os fundos de venture capital um instrumento fundamental para as empresas emergentes na obtenção de capital necessário para sua formação e crescimento. Porém, por tratar-se de um investimento de risco, para que referida modalidade de investimento possa atingir seus objetivos, é imprescindível atenção e cuidado na elaboração dos contratos, em especial do term sheet, permitindo que todos os envolvidos tenham uma visão clara do negócio e seja possível mitigar os riscos que envolvem essa modalidade de investimento.